domingo, 4 de setembro de 2016

A Mangueira Que Humilha é a Mesma Que Salva

A Mangueira Que Humilha é a Mesma Que Salva
Quando eu era criança gostava de brincar no jardim, da minha casa, e molhar as plantas nos dias ensolarados. Porém eu não gostava de jogar mangueira nelas, pois preferia exercer esta atividade com um regador. Afinal este instrumento parecia ser mais delicado e, além disto, através dele eu simulava uma chuva suave acariciando as pétalas e folhas das flores.
Mais tarde passei a ajudar nas tarefas domésticas. Porém, na hora de limpar o chão não queria saber de mangueira. Nestas horas eu pegava um balde e gostava de ver a minha imagem refletida nele. Porém lavar o chão com mangueira era como se fosse uma espécie de violência com os meus passos. Pois o balde parecia ser algo mais leve, que não apagaria minhas pegadas astrais, porque quando eu usava este objeto uma música não saia da minha cabeça:
“ – Balde de água na cabeça, lá vai Maria
Sobe o morro e desce o morro com a criança
Lá vai, Maria...”
Deste jeito, eu dançava a coreografia desta canção.
Porém, foi na minha adolescência, que descobri que a mangueira tem a capacidade de salvar vidas, não apenas em incêndios. Mas, em situações bizarras, também.
Num dia de verão eu, minha irmã e meu primo, Rodrigo, estávamos comendo peixe na garagem da minha tia. Quando, de repente, o garoto engasgou-se com uma espinha de peixe. Então com a intenção de socorrer o pequeno, peguei a mangueira que estava à vista, abri a torneira e enfiei água em sua garganta. Assim a espinha foi goela abaixo e garoto ficou são e salvo.
Anos mais tarde, eu e uma amiga fomos a uma igreja comer o bolo de Santo Antônio que costumava vir com um bonequinho dentro. Minha colega comeu com tanta voracidade que se engasgou com o boneco. Naquele mesmo instante vi uma mangueira, no jardim do templo, e enfiei água goela abaixo. Depois encaminhei a jovem ao hospital e tudo ficou bem.
Em 1999, o Brasil enfrentava uma crise, por isto era difícil achar emprego. Desta maneira, apesar do curso superior, só consegui serviço como “office-girl” e auxiliar de serviços gerais numa firma de vendas de linhas telefônicas, localizada no bairro São Francisco, em Curitiba. Uma tarde, eu estava lavando a entrada desta loja. Quando, de repente, um inimigo da época da faculdade começou a me provocar:
- Empregadinha!
- Office-girl!
- Estudou tanto para lavar o chão!
- Bem feito!
Naquela hora o meu sangue subiu. Então, lancei a mangueira com água em direção ao rapaz, que ficou todo molhado. Em compensação passei dias com medo de que o moço contasse o ocorrido para a dona do estabelecimento, pois eu poderia perder o emprego.
Portanto, a mangueira que salva é a mesma que humilha.
Luciana do Rocio Mallon



Nenhum comentário:

Postar um comentário