A Mangueira
Que Humilha é a Mesma Que Salva
Quando eu
era criança gostava de brincar no jardim, da minha casa, e molhar as plantas
nos dias ensolarados. Porém eu não gostava de jogar mangueira nelas, pois
preferia exercer esta atividade com um regador. Afinal este instrumento parecia
ser mais delicado e, além disto, através dele eu simulava uma chuva suave
acariciando as pétalas e folhas das flores.
Mais tarde
passei a ajudar nas tarefas domésticas. Porém, na hora de limpar o chão não queria
saber de mangueira. Nestas horas eu pegava um balde e gostava de ver a minha
imagem refletida nele. Porém lavar o chão com mangueira era como se fosse uma
espécie de violência com os meus passos. Pois o balde parecia ser algo mais
leve, que não apagaria minhas pegadas astrais, porque quando eu usava este
objeto uma música não saia da minha cabeça:
“ – Balde de
água na cabeça, lá vai Maria
Sobe o morro
e desce o morro com a criança
Lá vai,
Maria...”
Deste jeito,
eu dançava a coreografia desta canção.
Porém, foi
na minha adolescência, que descobri que a mangueira tem a capacidade de salvar
vidas, não apenas em incêndios. Mas, em situações bizarras, também.
Num dia de
verão eu, minha irmã e meu primo, Rodrigo, estávamos comendo peixe na garagem
da minha tia. Quando, de repente, o garoto engasgou-se com uma espinha de
peixe. Então com a intenção de socorrer o pequeno, peguei a mangueira que
estava à vista, abri a torneira e enfiei água em sua garganta. Assim a espinha
foi goela abaixo e garoto ficou são e salvo.
Anos mais
tarde, eu e uma amiga fomos a uma igreja comer o bolo de Santo Antônio que
costumava vir com um bonequinho dentro. Minha colega comeu com tanta voracidade
que se engasgou com o boneco. Naquele mesmo instante vi uma mangueira, no
jardim do templo, e enfiei água goela abaixo. Depois encaminhei a jovem ao
hospital e tudo ficou bem.
Em 1999, o
Brasil enfrentava uma crise, por isto era difícil achar emprego. Desta maneira,
apesar do curso superior, só consegui serviço como “office-girl” e auxiliar de
serviços gerais numa firma de vendas de linhas telefônicas, localizada no
bairro São Francisco, em Curitiba. Uma tarde, eu estava lavando a entrada desta
loja. Quando, de repente, um inimigo da época da faculdade começou a me
provocar:
-
Empregadinha!
-
Office-girl!
- Estudou
tanto para lavar o chão!
- Bem feito!
Naquela hora
o meu sangue subiu. Então, lancei a mangueira com água em direção ao rapaz, que
ficou todo molhado. Em compensação passei dias com medo de que o moço contasse
o ocorrido para a dona do estabelecimento, pois eu poderia perder o emprego.
Portanto, a
mangueira que salva é a mesma que humilha.
Luciana do
Rocio Mallon
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