A Noite Em
Que Entrei, Ás Escondidas, no Concurso Glamour Girl
Desde
criança sempre achei que os concursos de belezas eram competições artificiais.
Pois tinham ilusões e não avaliavam as qualidades interiores das pessoas.
Ainda na
infância, nos anos 80, descobri que em Curitiba havia um concurso de beleza
bizarro chamado Glamour Girl, onde as moças usavam cortes selvagens, estilo a
pantera Sara Fawcet, com permanentes e laquês. Sem falar dos vestidos de paetês
que transformavam as jovens em verdadeiras árvores de Natal de shoppings. Logo
pensei:
- Um dia,
ainda participarei de um concurso destes, só para pegar o microfone e falar
tudo o que penso de um evento assim.
Porém
descobri que meu sonho era praticamente impossível. Pois as participantes
pertenciam à classe alta da cidade e os convites eram caros.
Os anos 90
chegaram e o concurso bizarro continuou. Porém um dia precisei posar na casa da
minha avó e notei que o Glamour Girl, daquele ano, seria realizado num clube
perto do bairro dela. Assim esperei ela dormir, peguei um vestido de paetês,
botei laquê no meu cabelo que era naturalmente crespo e fiz maquiagem de vilã
de novela mexicana. Por cima, da roupa extravagante, coloquei uma capa comprida
e fui a pé até o local. Mas para entrar precisava de convite e eu não tinha
grana para comprar o bilhete. Deste jeito, decidi penetrar pelos fundos e menti
ao vigilante:
- Eu sou a
repentista contratada para animar o evento.
- Diga uma
palavra que eu faço um poema com o tema que você escolheu.
Desta
maneira o guarda respondeu:
- Paz.
Naquele
mesmo instante eu disse:
“- Eu
virarei a verdadeira paz
Se você me deixar entrar
Neste clube
da cor lilás
Para que eu
possa me apresentar.”
Após este
verso, o guarda me deixou entrar.
Do camarim
observei algumas candidatas desfilarem até o apresentador exclamar:
- Agora,
teremos um intervalo!
Como um
raio, entrei no palco, peguei o microfone e falei:
- Boa noite!
- Sou
repentista!
- Diga uma
palavra que eu faço um poema com o tema sugerido.
Uma mulher
gritou do fundo:
- Beleza!
Eu fiz o
verso:
“- Dizem que
a beleza
Não enche a
mesa
A bela
física é apenas uma armadura
Pois, o que
vale é uma alma com ternura.”
Logo,
perguntei:
- Mais
alguma sugestão?
Um senhor
falou:
- Concurso.
Deste jeito
declamei:
“- Beleza
interior não se mede em concurso
O que vale é
um caloroso abraço de urso
Quem desfila
hoje como uma delicada borboleta
No futuro
poderá virar um maracujá de gaveta.”
Rapidamente
indaguei:
- Mais
alguma palavra?
Uma senhora
gritou:
- Cabelo!
Eu disse:
“- O cabelo
é a moldura do rosto
Que deve ter
um penteado de bom gosto
Mas no
desfile só tem laquê e permanente
De ser livre
e solto, o cabelo fica carente.”
Recebi
muitas palmas. Mas, de repente, um senhor careca e muito calmo, falou com
educação:
- Parabéns,
menina.
- Mas acho
que seu show não estava na agenda.
- Apesar da
sua invasão, gostaria de abrir o espaço da minha coluna, do jornal, para alguns
poemas seus. Porém, agora peço a gentileza de deixar o palco porque o evento
precisa seguir normalmente.
Agradeci a
aquele senhor com a cabeça e notei que os seguranças estavam me olhando torto.
Por isto, fui direto à porta de saída e nunca mais me esqueci daquela noite.
Naquela
passarela, eu não fui Cinderella porque me senti muito mais que isto. Pois fui “Poetella”,
sem sapato de cristal e sem príncipe encantado. Porém com uma magia de realizar
sonhos através de versos.
Luciana do
Rocio Mallon
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