segunda-feira, 26 de maio de 2014

O Dia Em Que Dancei Valsa com a Gilda

O Dia Em Que Dancei uma Valsa com a Gilda
         
Era 12 de outubro de 1980 e meu pai disse:
- Vamos se arrumar que eu levarei você para a festa do Dia das Crianças no Passeio Público.
Ao escutar isto, minha mãe colocou um vestido cor-de-rosa em mim, cheio de babados e com um laço atrás, uma verdadeira peça que combinava com uma garota de seis anos, idade que eu tinha na época.
Ao chegar ao Passeio Público, olhei os bichos, escutei um som que vinha de longe. Então, de repente, larguei das mãos dos meus pais e logo me aproximei de uma banda de palhaços que estava tocando uma valsa. Assim comecei a bailar sozinha. Quando, como um raio, um homem de barba, porém com roupas femininas mais precisamente um vestido florido, me tirou para dançar. Como achei a personagem engraçada, aceitei e afirmei:
- Um homem vestido de mulher.
Logo, o dançarino me corrigiu:
- Errou.
- Pois sou uma mulher vestida de homem.
Desta forma perguntei:
- Qual é o seu nome?
A pessoa respondeu:
- É Gilda, em homenagem à atriz do filme: Nunca Houve uma Mulher Como Gilda.
Após estas palavras, senti “flashes” de curiosos tirando fotos da nossa dança.
De repente, a música acabou e dei um giro. Mas, quando voltei ao normal, notei que Gilda tinha sumido. Como não sabia o nome daquela valsa, fui até o maestro da banda e perguntei:
- Moço, qual é o nome da música que acabou de tocar?
Ele respondeu:
- Chama-se Giulia Gentil.
Logo comentei:
- Giulia?
- Igual o nome da pessoa que estava dançando comigo?
O músico explicou:
- Não.
- O nome daquele rapaz é Gilda.
- Na verdade, ele é um homem que se veste de dama.
De repente, escutei uma voz gritando meu nome, era minha mãe falando:
- Luciana?
- Onde você estava?!
- Procurávamos você até agora!
Algum tempo se passou e em maio de 1982, ganhei uma caixinha de música de Lúcia Hundezinski, a empregada da minha tia-avó, que disse:
- Estou dando-lhe esta caixinha de música que tem mais de cem anos.
- Espero que goste.
-Quando eu abri esta caixa, notei que havia um casal de bonequinhos dançando conforme a música, só que era uma mulher comum dançando com um homem de barba, que usava um vestido feminino.
Então, Lúcia explicou:
- Há certos lugares do Leste Europeu onde os homens dançam vestido de mulheres.
Assim, pensei em voz alta:
- Isto me lembrou a Gilda.
A moça indagou:
- Lembrou-se de quem?
Eu falei:
- Ah...
- Esquece!
Sempre que eu olhava para aquele objeto, era como se ele não me pertencesse. Por isto, geralmente, me vinha a idéia de oferecer a caixinha de música à Gilda. Mas, não sabia onde encontrá-la.
Em fevereiro de 1983, minha avó convidou-me para ir ao centro de Curitiba, e, tive vontade de levar a caixinha de música junto. De repente, passando pela Rua XV, avistei a Gilda: de vestido, porém mais magra e abatida. Desta maneira, cheguei perto dela e disse:
- Você se lembra de mim?
- Você dançou valsa comigo no Passeio Público!
- Este presente é para você: uma caixinha de música.
Deste jeito, Gilda deu um sorriso, abriu o objeto e me deu um beijo na testa. Depois ela comentou:
- Uma caixinha de música por um beijo na testa.
Em março de 1983 escutei nos noticiários que assassinaram esta personagem da cidade.
Gilda foi uma personalidade que marcou Curitiba. Por isto, peço para que as pessoas que tiverem alguma foto de uma menina, de cor-de-rosa, dançando com esta personagem no Passeio Público para que entrem em contato comigo. Pois a garota, do retrato, sou eu com seis anos de idade.
Luciana do Rocio Mallon






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