Estou Mais Para Pomba-Gira do Que Para Gótica
Meu nome é Luciana do Rocio, escrevo lendas, faço repentes e
minha cor favorita é a vermelha, principalmente, em minhas roupas.
Semana passada, fui a um evento para vender meu livro
intitulado Lendas Curitibanas e uma pessoa aproximou-se de mim e disse:
- Então você é a menina que escreve lendas?!
- Eu pensava que você era gótica, vestisse preto e tivesse
um rosto depressivo. Afinal, mulher que escreve contos de terror tem obrigação
de colocar roupas escuras e visitar, constantemente, cemitérios. Poxa, você
parece mais uma Pomba-Gira do que uma redatora de lendas urbanas.
Desta maneira, respondi:
- O fato de alguém achar que uma escritora de terror precisa
ser gótica é porque está amarrado a estereótipos, pois cada autor tem seu jeito
de se inspirar. No meu caso, não preciso vestir negro e nem visitar cemitérios
para escrever algo interessante. De vez em quando, quando faço pesquisa sobre
as lendas, vou aos lugares misteriosos, que nem sempre tratam-se de campos-santos.
Não tenho nada contra as artistas que seguem a moda gótica, pelo contrário,
acho que elas ficam lindas, pois a pele branca contrastando com roupas escuras
lembram as musas dos poetas do século dezenove, em especial Álvares de Azevedo.
Porém, devemos lembrar que este estilo é uma herança, totalmente, européia. Não
chego a ser de um nacionalismo radical como o do Policarpo Quaresma, mas acredito
que a cultura brasileira deve ser lembrada e valorizada, apesar dela ser o
produto das misturas de tradições internacionais. Deve ser por isto que me
sinto bem ao vestir vermelho, usar leque, passar perfume forte e fazer repentes
em voz alta como se estivesse em transe, características que fazem muitas
pessoas lembrar da entidade Pomba-Gira da Umbanda. Realmente, esta personagem
tem as suas origens em semi-deusas européias. O nome Pomba-Gira tem suas raízes
nos escudos yônicos, que algumas guerreiras mitológicas usavam, pois elas
carregavam a figura de uma pomba nos seus escudos. A palavra gira é devido às
várias reencarnações que estas mulheres fizeram na Terra com objetivo de ajudar
o ser humano, principalmente, nas artes ou como autoras de obras. Por isto, a
Pomba- Gira não é o espírito de uma prostituta, e, sim, uma musa inspiradora.
Esta entidade foi incorporada na Umbanda do Brasil no final do século dezenove
de uma maneira bem peculiar. Como as guerreiras semi-deusas originais usavam vermelho,
habitavam a península Ibérica, ou, seja Portugal e Espanha, as vestes da
Pomba-Gira passou a ser desta cor, porém tudo com um toque bem brasileiro. O
objetivo desta entidade sempre foi inspirar os artistas, mas por causa das
lendas e causos que surgiram sobre esta personagem no Brasil, ela passou a
atender pedidos e conselhos amorosos.
Aqui, é possível concluir que uma escritora que pesquisa
lendas como: Saci-Pererê, Mula-Sem Cabeça, Boi-Tatatá, Gato Malhado Kiko da
Boutique, Papagaio Rezador da Igreja dos Passarinhos, Pavão Prateado do Passeio
Público, Fantasma da Encruzilhada e
Bailarina de Carmim da BR-116 sempre vai
estar mais para Pomba-Gira do que para Gótica.
Luciana do Rocio Mallon
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