Lenda do Anjo da Castidade
Das lendas
que me contaram quando eu era criança, a que mais me traumatizou NÃO foi a
Lenda do Lobisomem e NEM a do Bicho Papão, e, sim a Lenda do Anjo da Castidade.
A minha infância
foi recheada de causos populares, passados de geração em geração. Apesar dos
adultos confessarem, já na primeira infância, que Papai-Noel, Coelhinho da
Páscoa e Cegonha nunca existiram, eu passei anos da minha vida acreditando na
Lenda do Anjo da Castidade.
Uma vez
falaram, desta maneira, para mim:
“- Nunca
tenha relações íntimas, antes do casamento, porque o Anjo da Castidade vê tudo.
Toda a noite ele visita as meninas para verificar se elas não deram liberdade
para algum homem. Então para a garota que nunca foi tocada, o anjo traz, como
prêmio, um marido rico, bonito, viril e
fiel. Mas quando este querubim descobre que a menina não é mais donzela, no
mesmo instante, ela perde a proteção divina e só consegue maridos bêbados,
bandidos, efeminados e maus. Também nunca se esqueça de lavar muito bem as
partes íntimas no bidê e de colocar calcinhas delicadas. Pois toda a noite o
Anjo da Castidade vem fazer a sua revista. Afinal, este querubim é mais
poderoso do que o Cupido, pois ele guia através da sua luz espiritual os
companheiros bons somente para as meninas que se preservam.”
A partir
desta história, eu comecei a me lavar todos dos dias no bidê, antes de dormir, e
passei a só vestir calcinhas com rendas, ou, estampas bonitas. Também comecei a
acreditar que os melhores homens eram destinados só para as mulheres virgens.
Com o passar
do tempo passei a lavar as minhas partes íntimas, várias vezes por dia no bidê,
o que estava prejudicando a minha pele. Assim fui à médica que me receitou
cremes e falou que eu estava com TOC, Transtorno Obsessivo Compulsivo.
Só depois de
alguns anos, descobri que o Anjo da Castidade não passava de uma história que
as mães contavam para manter as suas filhas na linha. Pois vi que mulheres
travessas conseguiam maridos bons.
Hoje, não
tenho mais o TOC, apenas uma ponta de trauma causada pela Lenda do Anjo da
Castidade.
Luciana do
Rocio Mallon
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